CONTO #25: Man about town, ou Enquadrando o savoir-faire (O. Henry)


         

             
            Eis um conto sobre autoconhecimento.
          Publicado pela primeira vez em 1906, Man about town é contado por um narrador com uma dúvida terrível: quem seria o Man about town? Onde vive? Do que se alimenta? O que faz para se divertir?
       Nosso narrador, acostumado aos rótulos dados a determinados grupos de pessoas e seus estereótipos, se depara com esse rótulo que simplesmente não sabe definir - e isso o deixa extremamente incomodado. Não descansará até descobrir quem é o Man about town, "nem que tenha que varrer Nova York de Battery a Coney Island".  Portanto, sai pela cidade, sem destino definido, entrevistando as mais diversas pessoas que encontra pelo caminho, perguntando se conhecem, se já viram, se sabem onde encontrar um Man about town.
          Por vezes, composto em forma de entrevista, outras, trazendo algumas digressões sobre estereótipos batidos e bem conhecidos do narrador, o conto é escrito de forma leve, direta, irônica e divertida. O autor deixa o leitor curioso, também, para saber quem seria o bendito Man about town - e o final, rápido, sem enrolação, não deixa de ser surpreendente.

"Havia duas ou três coisas que eu queria saber. Não gosto de mistérios. Por isso comecei a investigar.
Demorei duas semanas para descobrir o que as mulheres carregam em suas malas de viagem. Então passei a perguntar por que um colchão é feito de duas partes. (...) O terceiro gole, a que eu tanto ansiava na fonte do conhecimento estava relacionado a um personagem conhecido como "Man about town"."
(p. 21)

"- Fico feliz que tenha tocado no assunto; já senti a influência maligna dessa figura noturna em nossa cidade, mas nunca pensei em analisá-la. Percebo agora que o seu tipo deveria ter sido classificado há muito tempo."
(p.  27)

"Deixei o hotel e caminhei pela Broadway. A busca pelo Man about town deu um agradável sopro de vida e interesse ao ar que eu respirava. Eu me sentia feliz por estar em uma cidade tão grande, complexa e diversificada. "
(p. 28)


Onde encontrar Man about town, ou Enquadrando o savoir-faire: Contos (O.Henry)

CONTO #24: Eveline (James Joyce)



          Publicado pela primeira vez em em um jornal local irlandês em 1904, mais tarde, em 1914 passou a fazer parte da coletânea de contos do autor, intitulada Dublinenses
          Eveline, uma jovem envolvida com um marinheiro que a convida a fugir e viver com ele, reflete sobre a vida enquanto observa a paisagem através de uma janela. Sua mãe, antes de morrer, fez a jovem prometer cuidar do pai e dos irmãos - um deles, o mais velho, já morreu, o outro vive viajando a trabalho; resta apenas o pai, que a maltrata (por ser a única mulher, talvez). Sua vida se resume ao convívio com esse pai pouco amoroso, ao seu trabalho como vendedora realizado sem vontade e seus encontros com o jovem marinheiro, que lhe oferece a fuga perfeita de uma existência sem cor.
          O conto gira em torno das ponderações de Eveline, os prós e os contras dessa escolha que precisa ser feita, e o medo da impossibilidade de se voltar atrás. Sua escolha não deixa de ser surpreendente.

"Havia concordado em partir, em deixar seu lar. Seria sensato? Tentou pesar os prós e os contras de sua decisão. Bem ou mal, tinha em casa abrigo e comida. vivia entre pessoas que sempre conhecera. Precisava, é claro, trabalhar pesado em casa e no emprego. Que diriam na loja ao saberem que fugira com um homem? Que era uma tola, talvez, e preencheriam a vaga publicando um anúncio no jornal."
(p. 18)

"Levantou-se num súbito impulso de terror. Fugir! Frank a salvaria. Iria lhe dar uma vida, talvez também amor. Queria viver. Por que haveria de ser infeliz? Tinha direito à felicidade. Frank ia envolvê-la em seus braços, protegê-la. Ele a salvaria."
(p. 21)

Onde encontrar Eveline: Dublinenses (James Joyce)

CONTO #23: Kótin, O Provedor e Platonida (Nikolai Leskov)

         


       Publicado pela primeira vez em 1867 como digressão e parte integrante da novela Os que esperam o borbulhar das águas: crônicas romanescas, e mais tarde reelaborado e publicado separadamente, Kótin, O Provedor e Platonida, apesar do título enganar num primeiro momento, nos conta a história de dois personagens principais (Kótin torna-se O Provedor), que sofrem desgostos terríveis, mas escolhem o caminho da virtude.
          Kótin (Konstantin Pizónski) fora criado como menina pela mãe, que num dado momento se vê obrigada a buscar refúgio num convento. Só bem mais tarde se descobre menino, e essa confusão sexual em nada mais parece interferir em sua vida, a não ser pelo "amor materno" que Kótin sentirá por duas orfãs que acaba adotando. Os três levam uma vida miserável, mas Kótin, que, conforme dito, escolhe o caminho da virtude, é reconhecido pelo povo como um grande homem, e chega a ser considerado indispensável em sua cidade.
          Já Platonida é uma mulher muito bonita, casada, e que mora na mesma casa com o cunhado e seu sogro. É assediada pelo cunhado, que aparentemente sente um amor genuíno pela esposa do irmão. Mais tarde, Platonida se verá vítima de abuso por parte do sogro, também, e dará um jeito de seguir seu caminho.
          As histórias de Platonida e Kótin se entrelaçarão nessa história contada com um quê de conto de fadas, por um narrador que nos mostra tantas vicissitudes da vida humana de forma bem humorada e por vezes, cômica.

"É bem sabido que nunca e a ninguém uma mulher é capaz de revelar simpatia mais generosa
e melhores serviços do que a quem, casualmente, torna-se testemunha de alguma fraqueza do seu coração. Platonida Andrêievna confirmou a verdade absoluta dessa afirmação(...)"
(p. 29)

"Pizónski talvez já devesse tomar cuidado para não despertar contra si a inveja e a maledicência, mas ele se comportava com quietude e retidão e, sem se ufanar dos próprios êxitos, não  despertava inveja de ninguém."
(p. 35)

Ë assim, Pizónski se ergueu, sem apadrinhamento e sem proteção, e era
ele próprio quem protegia aquilo que
deve ser protegido: a infância."
(p. 41)

Onde encontrar Kóyin, O Provedor e Platonida: A Fraude e Outras Histórias (Nikolai Leskov)



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