Se
vocês acompanham este humilde bloguinho, sabem que não costumo fazer resenhas
de livros, salvo raras exceções. Isto ocorre por dois motivos: primeiro porque
tem gente mais competente do que eu para isso e, segundo, porque tenho lido
menos do que deveria e assistido mais filmes e séries do que manda a melhor
medicina.
De
fato, quando a Tati me convidou para escrever neste espaço, achei por bem ocupar o
lugar que estava mais vazio. Pensei...“take one for the team”, HP. Resolvi então
me dedicar a palpites sobre a vida, comentar sobre os seriados que acho bacanas e a discorrer
descompromissadamente sobre a sétima arte. Mas a verdade é que, por vezes, os
universos se fundem e o resultado nem sempre é bom. Dito isto, seria justo comparar
livros com filmes?
Acredito que é natural e quase inevitável que isso aconteça, até por força do hábito. Agora, se é
apropriado ou correto, já é outra história. Penso que não é e o motivo é simples: só se podem
comparar coisas similares. Comparar livros com filmes é a mesmíssima coisa que
comparar maças com laranjas. É pertinente dizer que se prefere uma coisa à
outra, mas não se pode afirmar que uma é “melhor” do que a outra.
E
convenhamos, em que pesem as adaptações cambetas, as “chupinhações” descaradas,
as descaracterizações vagabundas, a linguagem é totalmente distinta. Tal paragonação não é justa e nem deveria acontecer, vez que até os sentidos utilizados diferem. A experiência não se confunde.
No
cinema se enxerga através dos olhos do diretor, há a limitação técnica, a orçamentária, a de interpretação, entre tantas. Com os livros, o limite é o mesmo
que sua imaginação empresta às palavras do autor. Uma casa descrita, por melhor
que seja, ainda é aquela que sua mente constrói. Um personagem, mesmo quando seus
traços e maneirismos são relatados com riqueza de detalhes, continua a ser criado nos
moldes do que a mente do leitor esculpe. No que tange aos filmes, existe ainda a insuperável questão da restrição do tempo, o que não ocorre, é cristalino, na literatura.
Para mim só existem dois tipos de livros. Os bem escritos e os mal
escritos. Com filmes não muda muito. Há aqueles que são bem filmados e os que
não são. É claro que uma miríade de classificações e conceitos podem ser
acrescidos, e, excluindo-se a obra eivada de pretensão, creio que o correto seria sermos
flexíveis, tanto com os alfarrábios, quanto com as películas. Crucificações hidrófobas ou defesas passionais, não
ajudam em nada a desenvolvermos o melhor senso crítico. Por outro lado, não é de bom alvitre nos privarmos de criticar as manjadas tolices, as trilogias "obrigatórias", as sequências caça-níqueis, os remakes desnecessários ou mal feitos, que são lançados à granel no mercado, como se fossem tomates passados, daqueles empurrados em uma
xepa qualquer.
Ademais,
vamos combinar que para Hollywood o que vale é o velho “If money is there, I
don’t care". Podemos citar, por exemplo, a força comercial da literatura
“adolescente”. Com o sulco aberto pelo cada vez maior e mais rentável filão da
literatura “Y.A.”, é natural que esse mercado se estendesse aos cinemas. Com
livros que, em sua maioria, possuem
qualidade no mínimo duvidosa, fica mais difícil ainda, se esperar filmes que
valham realmente a pena serem vistos. E assim vai.
Mas é preciso lembrar que adaptações não passarão de...adaptações, ora. Assim como é injusto
afirmar que todo livro catapultado para o cinema, necessariamente será ruim. Em
alguns casos, não muitos, a película supera o papel. Cumpre ressaltar que o
caminho, via de regra, é do livro para o cinema e não o contrário. Teremos
inevitáveis perdas ou compensações nessa transposição, é claro. Se elas existem em traduções, do papel para o papel, imaginem de um livro para um filme, onde a linguagem é totalmente distinta.
Destarte,
seria mais coerente, menos leviano, não traçarmos tal comparação, senão quando muito
bem delimitada por considerações de forma. O melhor mesmo seria não fazê-la.
Mas como frisei antes, é inevitável e vai continuar a ocorrer.
Contudo,
se ainda assim, aquela coceirinha bater e nos sentirmos irrefreáveis em nossa
palhaçadinha de meninão sabe tudo, que precisa descer a
lenha no filme que se apropriou daquele maravilhoso best-seller, escrito
por seu autor predileto, verdadeiro gênio iluminado por deus, tentemos ao
menos nos lembrar de que a ideia do vampiro que brilha no sol e da adolescente
chata, indecisa entre a necrofilia e a zoofilia, já era ruim antes de contar com
a ajuda imprescindível do modorrento Robert Pattinson e da insossa Kristen Stewart.
E por
derradeiro, nos recordemos de que a Brida da Tv Manchete pelo menos era engraçada. Humorismo involuntário, talvez. Eu ria, confesso. Não ganhou nenhum prêmio, não foi absurdamente assistida, ninguém dela se lembra. Tampouco o roteiro parecia apresentar erros grosseiros de regência ou concordância quando verbalizado, o que não seria surpresa caso tivesse ocorrido, face restar como espólio natural e genuíno de um cartapácio pacóvio, escrito de forma medíocre. Já o livro propriamente, todos conhecem. O "romance esotérico" não conseguiu me divertir como a novelinha da extinta emissora, mas vendeu aos montes e consagrou o autor mais uma vez, como se os igualmente pedestres "Diário de um Mago" e "O Alquimista", já não contivessem empulhação suficiente. Fico com a Wicca da tv. A produção percebeu de cara que não era para levar à sério e tocaram o barco. Foi melhor assim.
Pelo que se depreende, não é por ser livro ou autor, ao invés de filme ou diretor, que se obtém garantia de qualidade. Não se cuida apenas de forma, mas sobretudo de conteúdo. Ruim pode ser o livro e péssimo pode calhar de ser o filme. Como é possível ser deliciosa a maça e espetacular a laranja.
Pelo que se depreende, não é por ser livro ou autor, ao invés de filme ou diretor, que se obtém garantia de qualidade. Não se cuida apenas de forma, mas sobretudo de conteúdo. Ruim pode ser o livro e péssimo pode calhar de ser o filme. Como é possível ser deliciosa a maça e espetacular a laranja.
Tem muita coerência o que você diz. Mas parece inevitável a comparação, é automático, quase uma mania.
ResponderExcluirConcordo em parte. Como sempre, há casos excepcionais. Em janeiro, por exemplo, eu li para um fórum literário 2001: Uma Odisseia no Espaço, que foi escrito por Arthur C. Clarke ao mesmo tempo em que Kubrick escrevia o roteiro do filme. Acabou que o livro e o filme ficaram interligados. Mas é fato que tanto um livro quanto um filme tem que se sustentar sozinhos.
ResponderExcluirNão muda nada. Mesmo com o próprio Clarke também escrevendo parte do roteiro para o filme. Mesmo com um influenciando ao outro. As experiências são distintas. O livro pode ser excelente mas isso não traz a garantia de um filme igualmente bom. Isso se deu muito mais pelo talento de Kubrick na direção do que pq qualquer outro motivo, vez que cinema é, sobretudo, a arte do diretor. Mas, ainda assim, poderia haver um fracasso na transmissão da linguagem visual e permanecer a excelência da escrita. Comparar coisas distintas é incorrer em erro, mesmo quando interligadas em qualquer aspecto. Simples assim. O debate acerca da soberania de livros sobre os filmes serve apenas para engatar um bate papo trivial na mesa de bar, mais nada. O pior é quando a comparação embute aquele discurso pseudo-intelectual de afirmar que livros são sempre melhores do que os filmes. Fazemos isso por hábito, quase por tradição. Mas essa discussão não se sustenta intelectualmente. Só se pode comparar o que é similar. Podemos dizer que tal livro é bom e que aquele filme é ruim. Podemos dizer que preferimos o livro ao filme, ou vice-versa, mas não que um é melhor do que o outro. Assim como com maças e laranjas. Apesar de ambas serem frutas...o sabor é apenas diferente. Nem melhor, nem pior.
ExcluirSe você está falando de comparar o filme "Titanic" com o livro "Chapeuzinho Vermelho", eu concordo que é a mesma coisa de comparar maçãs com laranjas. Mas se você está comparando um filme e um livro que tem uma mesma história, aí eu acho que é falsa analogia a comparação com maçãs e laranjas. Pense assim. Por que as pessoas comparam e por que vão continuar sempre comparando? Por que a história é a mesma! Quando eu digo que gostei mais do filme do que do livro, ou vice-versa, eu estou, em outras palavras, dizendo que preferi a forma como a história foi contada no livro ou no filme. São experiências diferentes, lógico que são, e ninguém questiona isso, mas ambas são formas de arte. E arte competente é arte que emociona, toca, questiona, abala. Um mesmo material pode usado em um filme, um livro, uma peça de teatro ou um música e resultar em coisas completamente diferentes. Isso é óbvio. Mas o que as pessoas fazem quando elas comparam é analisar resultado emocional que isso provoca nelas. Eu não vejo isso como uma coisa ruim de forma alguma. Acho bem natural. O que eu acho errado é ficar procurando no filme elementos do livro e não compreender que as experiências vão necessariamente ser diferentes. E concordo com você que é extremamente pseudo-intelectual dizer que o livro é sempre melhor ; )
ExcluirNão há falsa analogia justamente pq livros e filmes não são similares. A falsa analogia é, justamente, mostrá-los como similares para poder promover a comparação. É exatamente disso que discordo.
ExcluirNão importa se a história é a mesma, pois a forma como é contada difere totalmente. A comparação é sempre feita não pq faz sentido, mas por hábito, por tradição, pq é simples fazê-la. Mas note que não há o hábito, salvo raras vezes, em que se compara a peça de teatro com um filme, por exemplo. Isso acontece pq não há comparação, mas tb pq não se criou o hábito. No máximo se diz que "a peça é maravilhosa" e que o filme é ruim. Mas não que a peça é melhor do que o filme. Entendeu a sutileza?
A maneira de contar a história por meios tão diferentes impende alterações, compensações, distorções que evidentemente afetam a experiência tornando a comparação improcedente. E analisar a afetação emocional com que uma experiência ou outra lhe atinge, só reforça o que eu disse. Vc pode comparar a emoção, mas não a experiência, ora. Vc pode dizer que o filme lhe afetou mais, mas não pq é melhor do que o livro. Vc pode dizer que o filme lhe afetou mais pq é bom e o livro nem tanto. Aí, sim, tudo perfeito. O problema só aparece quando vc coloca um ao lado do outro, traçando uma reta entre os dois. Aí, nesse exato momento, ocorre a falsa analogia.
Se vc diz que livros e filmes são similares pq se traduzem em arte, tb posso dizer que maças e laranjas são similares pq são frutas. Ver um filme e ler um livro, trazem experiências. Comer uma maça e um laranja tb.
Percebe como isso não basta para traçar a comparação? Ser similar é ser semelhante, correspondente. Um livro não é parecido com um filme, o que é parecida é a história. Assim como uma maça não é parecida com uma laranja por darem no pé, serem comestíveis e podermos fazer sucos com elas.
Se pode quantificar o prazer que se teve lendo tal livro ou vendo tal filme, como se pode dizer o que mais lhe apeteceu...a maça ou a laranja. Mas não se pode comparar coisas que não são similares. Só se pode comparar uma maça, com outra maça. Posso dizer que o Psicose é maravilhoso e que seu remake criou uma excrescência, pq possuo parâmetros similares para traçar uma comparação. No entanto, dizer que se prefere o filme ao livro, só tem validade como passatempo. Para jogar conversa fora, informalmente. Em nível acadêmico isso seria descartado imediatamente. É apenas esse meu ponto. Não que seja proibido ou pecado, rs. Apenas não faz muito sentido, mesmo sendo habito comezinho e enraizado. :)
"Vc pode dizer que o filme lhe afetou mais pq é bom e o livro nem tanto". Aí, sim, tudo perfeito". Entendi agora. Estávamos falando de coisas diferentes. Eu estava chamando de comparação dizer o livro é bom e o filme é ruim (ou vice-versa). Você está falando daquele tipo de gente absurda que fica comparando a cena do filme com a do livro e dizendo que faltou isso ou aquilo e que o livro é beeeem melhor que o filme. Tipo o que está acontecendo agora com a Menina que Roubava Livros. Concordo com você! Hahahahahahaha =D
Excluirquando se fala em adaptações estamos falando de algo que precisou ser modificado para que fosse possível ir para a telona. e a coisa começa a dar errado logo de cara. as pessoas esperam ver o livro completamente recriado, com os mínimos detalhes, como se o estivesse "lendo", quando na realidade ele está vendo o mesmo enredo modificado e reconstruído do avesso. Acho que não se trata de comparar ambas as coisas afinal, por mais que seja algo tirado de um livro, ele nunca será o mesmo, por mais similar que pareça. por exemplo: a menina que roubava livros. eu adorei a adaptação. fazia um tempo que não via uma adaptação tão boa quanto. mas, mesmo assim, em alguns trechos, era como se muitas cenas me fossem tiradas, muitas páginas fossem cortadas. e é isso que a adaptação faz. uma pessoa decide que aquela visão de mundo soa mais interessante do que a que eu, você ou sei lá mais quem possui.
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