Infidelidade e "Chororô" (por Hpcharles)


“I told my wife the truth. I told her I was seeing a psychiatrist. Then she told me the truth: that she was seeing a psychiatrist, two plumbers, and a bartender.” 

"No adultery is bloodless."
- Natalia Ginzburg

Pode parecer estranho, suspeito ou hipócrita, um heterossexual, já vivido, escrever taxativamente de forma negativa sobre infidelidade. Mas é o que farei. Só porque posso. E JUSTAMENTE porque sou vivido.

Em primeiro lugar, é necessário dizer que trabalhei com direito de família por muitos anos. Fui obrigado a ler a doutrina jurídica pertinente, esmiuçar seu desdobramento, conhecer as estatísticas afetas à matéria. Informo sem o menor temor de errar que, a separação ou o divórcio ocorrem, com poucas variáveis, por infidelidade ou por mau uso de dinheiro comum. Dessa feita, para a minha contrariedade, a labuta pela qual nunca me apaixonara de fato, me obrigou a funcionar como “ouvido amigo” para conversas quase sempre desagradáveis e que, inúmeras vezes, fugiam totalmente ao escopo do trabalho propriamente “legal”, outrora contratado.

Ademais, já aturei amigos e amigas bêbadas às três da matina, tomei porres eivados de companheirismo e também fui implacável, condescendente ou omisso, dependendo do caso e circunstância. Tudo isso me fez chegar a uma conclusão da qual seria difícil me distanciar sem abdicar do apego à honestidade intelectual: infidelidade ou é fraqueza ou burrice. Qualquer coisa fora disso, é chororô.

Não, não sou santo. Estou bem longe disso e o demônio, no qual não acredito, sabe bem. O que acontece e justifica minha opção pela tão propalada “tediosa e antinatural” vida monogâmica, quando abarcada, é o pragmatismo comunado com um pingo de caráter. Viram? Eu disse que era não era “bonzinho”.

Por tudo o que passei e assisti na vida, cheguei à brilhante conclusão de que “trair” (não gosto de como o verbo é usado “in casu”) dá um puta trabalho. O infiel, o adúltero, acima de tudo, precisa ser um James Bond. Um animal com os sentidos ultra apurados, sempre à espreita. Precisa estar alerta, atento a tudo, ser mais escorregadio do que quiabo. Um funâmbulo sempre lutando para não cair. Necessita ter disposição de pedreiro e memória de elefante. Além disso, a infidelidade gera custo, não se enganem. Não só pessoal, mas financeiro. Por que alguém quereria isso? Multiplicar o imenso trabalho proveniente de equalizar uma relação, constituindo mais uma?

“Ah, mas escolhi errado”, “ah, mas não amo mais”. Ué, que eu saiba a lei do divórcio foi instituída oficialmente em 1977 e, para quem não é casado, sei que dá para terminar até por SMS, apesar de achar calhordice de último quilate.

Então qual é o problema? Eu digo qual é o problema. Ele começa com CO e termina com VARDIA. O Paranauê é que é fraco, young Padawan. Melhor embromar e seja o que deus quiser, afinal não custa tentar. Tem chororô? Tem, sim senhor! Aquele mesmo, que sempre anseia tirar o cu de quem está mais sujo do que pau de galinheiro, da reta. Pois é. Aqui ele entra em cena com assiduidade nipônica e bota para fora o que há de mais patético no ser humano. “Foi um momento de carência”, “estava com problemas no trabalho”, “bebi demais”. Ahãm, com certeza uma gostosa qualquer lhe pegou de surpresa justamente no mesmo dia em que sua namorada dormiu de calça jeans, você descobriu que seu trabalho era uma merda e que estava cheio de manguaça nas fuças. Depois a miserável te obrigou a entregar sua virtude, ceder à lascívia e se submeter ao sexo voraz. Violentamente quebrou a garrafa do whisky 12 anos - que ela te fez pagar no “after hours” - colocou um pedaço de caco de vidro próximo à sua carótida e, cheia de tesão, gritou alucinada: ME FODE, SEU INFELIZ! Sabia!!!! Maldita devoradora! É justamente assim que elas agem com os indefesos ou insatisfeitos.

Novamente, para ficar bem claro. Não estou aqui me referindo diretamente a seu “desejo” de trair ou negando o cotidiano com qual as relações se debatem inapelavelmente. Me dirijo a posicionamentos adotados espontaneamente face a responsabilidades assumidas por gente crescida. Odeio moralismos, aliás nunca encontrei um só moralista genuíno em minha existência, apenas hipócritas travestidos. O que condeno é a burrice contumaz e a fraqueza coalhada de “bodes expiatórios”. Em qual momento do contrato de exclusividade que VOCÊ se propôs voluntariamente a aderir, te obrigaram a desempenhar o papel de vilão? E quem disse que nele há cláusula vitalícia? O que é, o pai da moça ou do moço vai até a sua casa quebrar suas patelas com um taco de baseball, “Joe Pesci`s style”, se você encerrar o enlace?

“Sim, mas é preciso pensar nos filhos”. Sei, então está desculpado. Você não faz o que deve por conta deles? Ótimo, vamos passar a “responsa” para os bacuris. É deles a culpa. Basicamente você comeu sua vizinha(secretária, colega de trabalho, ex namorada e afins) cinco vezes porque quer o bem dos moleques. Que legal você é, não?

Gente, em 2013 filho não segura mais ninguém, ou pelo menos não deveria. Só serve de desculpa para estender o sofrimento. Além disso, o assunto aqui é a infidelidade em si e não o motivo por ela  perdurar. O que acontece de fato, é que somos uma espécie formada por putos egoístas e que na hora em que interessa, usamos nossa “propensão natural” para desculpar o acordo que foi estabelecido lá atrás. Por outro lado, nos colocamos como os picões da evolução e usamos microondas para esquentar nossa comida e comê-la sentados à mesa, ao invés de jogá-la uns nos outros, de dentro de jaulas. Se quiser usar a carta do impulso para justificar um comportamento, acho justo que se lembre que também existe um impulso para refreá-lo. Chamamos a isso de “consciência”. Humanos normalmente a possuem. Ou você é o "Maníaco do Parque" e se calçar os patins é melhor sair da frente? Então, por favor...menos.

Dizer que trair é algo que “acontece”, é equino. Acidente de trem acontece. Infidelidade, NÃO. Ela é consentida. Ou alguém cai de zíper aberto e pau duro em cima de uma pessoa que, desavisada, estava por acaso, com as pernas abertas? “Acontece” é o que dizemos a uma criança que derrubou a bola de sorvete no chão. Se você foi infiel, contribuiu para sua infidelidade. Se não estava feliz, poderia e deveria ter dito que não estava. Poderia ter, a qualquer tempo, interrompido a relação e desfeito o “contrato”. Aquele mesmo que você, consciente, adulto e de livre vontade, “assinou”. O resto é CHORO!

Na verdade, o que ocorre com mulheres e homens mundo afora, é que precisam, antes de romper com o passado para constituir o novo futuro, arrumar um balão de oxigênio afetivo, um “snackzinho” para matar a fome quando for preciso. É a fraqueza compelindo a um “pré preenchimento” afetivo a fim de minorar a dor vindoura que, “surprise, surprise”, é inevitável. E que se foda se esse processo impende falta de respeito e o esquecimento do que sente aquela outra pessoa a quem uma vez você jurou amores, não é? Aquela mesma para qual você disse te amo, ou que prometeu, todo “nhunhuzinho”, não machucar.

Sei lá, eu tento ser condescendente mas não consigo. Não consigo entender pessoas que optam pelo caminho mais doloroso para fugir de um que já será doloroso o suficiente. A separação doerá para todos se a relação foi significativa de alguma forma. Por vezes dói mais para um do que para outro, é verdade, mas ainda assim, é uma merda. Por que colocar mais álcool na fogueira? Se realmente não foi “safadeza”(nunca vi alguém assumir que foi) e sim fruto de uma situação que se constituiu anteriormente, por que não abriu o jogo e picou a mula?

Como se vê, meus caros, está difícil fugir do binômio apresentado. O infiel ou é burro porque, por via oblíqua, aumenta os problemas e gastos em sua vida, além de não atacar o verdadeiro imbróglio que é a sua relação original, ou é fraco, porque não tem colhões para “botar o bacalhau para fora” evitando assim, mais adiante, um transtorno ainda maior, pois, tal qual o burro, ele posterga mas não soluciona.

É claro que você pode “ser fodão” e não ser pego. Claro, pode. Quer uma medalha por se achar malandro quando de fato é um otário? Sim, porque quem tem tamanho talento para ser ator ou atriz, deveria demonstrá-lo em lugar apropriado e não fazer da sua vida uma peça de mau gosto que, via de regra, traz consequências nefastas para gente que não comprou o ticket para o espetáculo. Que fique claro, infidelidade não é oriunda de oportunidade ou se explica pela mera insatisfação. Infidelidade tem, acima de tudo, relação com caráter. 

Então o que fazer, cacete? Tá bom, eu digo. Sugiro, com alguma experiência e muita pretensão, o remédio para não cair na esparrela de se machucar, de machucar aos outros e, de quebra, em alguns casos, ainda ter que pagar a porra de um advogado enxerido como eu, para limpar a merda que você fez quando descobriu que a vida é feita de escolhas mas também de compromissos assumidos. Estão preparados para a dica? Ela é foda! Inédita! Original! FIQUE SOLTEIRO, PORRA!

Se você não acredita em casamento, namoro e exclusividade, não se case, não namore e não se comprometa com a monogamia. Simples assim. Se você entende que o ser humano é infiel por essência, que a banda toca desafinado mesmo, que estudos afirmam, que é genético, que o Daniel filho se casou 50 vezes e não deu certo e, por isso ficou comprovado que é impossível se manter retilíneo, mais um motivo para fazer o fácil, não se aporrinhar e ser feliz em sua poligamia. Agora vou perguntar de novo: qual é o problema? Não suporta os domingos sozinho? Fraco ou burro, pode escolher.

Eis o “mistério da fé”. Não se pode ter tudo. Cresçam e lidem com isso. É o que tenho a dizer, em última análise. O que queremos é ter o melhor dos dois mundos. Todos querem. Mas em algum momento esses mundos colidem e você precisa escolher. Conheço pessoas felizes em ambos os universos, mas não conheço nenhum que é feliz os misturando. Talvez durante algum tempo, mas não como projeto de vida. Em algum momento a máquina emperra e o conserto é caro, ou impossível.

Dessa forma, para aqueles que optarem pela solteirice e seu condão de leveza e descompromisso, parabéns. Já joguei no time e foi legal durante um tempo. Tem seu valor, é inegável. Hoje virei casaca e estou muito feliz com a minha escolha. Para aqueles que querem embarcar no trem da vida a dois, seja ela como for, desde o namorico “vamos ver no que dá”, até o casamento “envelhecer juntos”, eu recomendo que sejam bacanas. Não perfeitos, mas bacanas. Que se disserem que amam, que amem de verdade. Qualquer um é capaz de dizer que ama, o importante mesmo é AGIR como quem "diz que ama". Não tente ser malandro com alguém que está a seu lado, aguentando as porradas da vida, você pode acabar como um “Mané”. O tiro pode sair pela culatra e você se foder de verde e amarelo. Esteja avisado.

Por fim, aceite que independente do que você escolher para sua vida, haverá consequências positivas e negativas, e elas serão medidas e proporcionais a seu comportamento em relação a elas. Não existem atalhos, existem opções. O cardápio está aberto à sua frente, mas o restaurante não mistura os pratos sem te cobrar muito caro para isso.

No entanto, não fique triste por não poder assobiar e chupar cana ao mesmo tempo. Se tudo falhar e, em seu âmago se der conta de que é um caso perdido, não se desespere. Você sempre poderá ser mórmon.
PS: Apenas para ficar claro, só porque a internet é o lar dos bravos e morada dos desententidos. O texto, apesar dos exemplos e das construções masculinas, se refere a homens e mulheres. Não tem passada de mão em cabelo com chapinha, não. 

12 comentários:

  1. Compartilho do mesmo pensamento que vc, HP. Parabéns pelo texto, disse tudo! Abraços!

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  2. Vivo dizendo que nada é perfeito, e é a mais pura verdade, ninguém vai ser 100% feliz solteiro ou casado, mais é preciso ter caráter independente do estado civil, como muito bem colocado no texto. Como sempre seu texto e a forma que expressa a sua opinião só merecem elogios. Continue nos proporcionando momentos de reflexão, faz muito bem.

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  3. Exatamente! Minha opinião é que SE a pessoa concordar e, como você disse, assinar o contrato da fidelidade, ela deve cumprir com as cláusulas deste. Mas se o relacionamento for ''aberto'' e sem exclusividade, não vejo problema. Como você bem falou, tudo tem seu lado positivo e negativo.

    Texto excelente, como sempre.

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  4. Que texto bem escrito...aliás todos!! Bem, entendi que é claro que são para homens e mulheres puladores de cerca. rss Mas foi inevitável eu não fazer uma ponte com um texto que li ontem, no blog da Jane Austen que fala na escolha do marido. Mas claro acho que os homens então tbm podem se beneficiar do conselho da JA em seus livros: "De todas as chaves mestras de Jane Austen para destrancar o potencial verdadeiro de um homem, as duas mais importantes são o “temperamento” e os “princípios”. Então, é isso vc falou para os comprometidos e se me permite acrescentei para os não comprometidos e que venham a querer se comprometer... Vc falou questão de caráter eu acrescentei, temperamento e ética.. abç

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    1. Penso que o "compromisso" independe de estado civil. Ele é pessoal e, em última análise, interno. É regido e perpetuado pelo caráter. Quem opta por manter uma relação aberta, que arque com ela. Por mim, se a pessoa está solteira e quer se relacionar com 10, é problema dela e sequer critico. O problema é assumir uma posição em relação a um tipo de relação com alguém e inventar desculpas porque não foi capaz de cumprir.
      A questão do temperamento é relevante sim. Abordei isso em algum texto antigo. Acho que possui mais relação com a mantença e continuidade da relação em si do que com infidelidade. Mas é importante, não há dúvida.
      Abçs.

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    2. Obrigada pelo feedback, penso da mesma forma a ética é exato isso, se diz que vai fazer, se se compromete cumpri...

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  5. O engraçado é que enquanto eu fazia a leitura do texto, uma citação do Nelson Rodrigues não saía da minha cabeça: "Chego aqui e vejo que ninguém ama ninguém. Que ninguém saber amar ninguém. Então é preciso trair sempre, na esperança do amor impossível." enquanto mais eu me aprofundava no seu texto, mais eu concluía que que a citação do N.R não tem muita profundidade, sei lá, agora parecem palavras tão vazias...o seu ponto de vista é inquestionavelmente mais sensato. É...acho que tá na hora de alguns amigos meus rever os próprios conceitos...

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    1. Pertinente sua lembrança de Nelson Rodrigues, de quem sou fã incondicional. É preciso, entretanto, inserir a frase citada, como tantas outras desse fabuloso escritor, dentro de um contexto. NR era um conservador que criticava a hipocrisia contida no conservadorismo. Com frequência voltava suas baterias contra o falso moralismo (aliás só acreditava que existia esse tipo de moralismo, o falso) pequeno burguês. Pegava o tijucano, o morador como Andaraí como judas, para explicitar a paradoxal mentalidade suburbana que, por um lado, vendia valores religiosos, tradicionais, mas em outra mão, o que comprava era o absoluto rompimento com esses mesmos valores pregados. NR, acima de tudo, criticava a hipocrisia. Leve em consideração o quão fabuloso era escrever assim, com tanta clareza e direção nos anos 50/60. Era preciso coragem, sem dúvidas.
      Um dia ainda escreverei um texto sobre NR aqui no blog.
      Grande abç.

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  6. Sensacional seu texto! durante a leitura fiquei inconformado que estava usando somente exemplos masculinos como adultero, mas o comentário no final justificou. Um outro ponto importante a ser dito é que as pessoas que estão de fora do relacionamento e que contribuem para a traição (sabendo que a pessoa é compromissada) também não possuem caráter. Ser cúmplice é injustificável em qualquer situação.

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  7. Só tenho uma coisa a dizer? Tu é foda!!!!!!! vai escrever assim na casa do caralh.....

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  8. Ótimo texto!
    Ainda há uma terceira opção: ser casado/namorando/noivo em um relacionamento, onde cada um trepa com quem quer, ou, frequentar casas de swing. Só que o cara (ou mulhé) nunca quer que 'o outro' também tenha a liberdade, não é mesmo?

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