Tyler Durden: "The things you own end up owning you." (Fight Club)
Envelhecer
é uma merda. E quem nega é porque é novo demais ou já está tão velho que não consegue
perceber a merda que é. Simples assim. Dito isso, existem algumas coisas boas a
serem agregadas com o andar da idade, além das inevitáveis mazelas oriundas da
velhice.
O que
há de ruim não é preciso nem se elencar, sendo o pior, talvez, o fato de que
sabemos que nosso tempo aqui neste planetinha azul, não durará tanto. Tirando
isso, vem as dores, a calvície e os cabelos brancos, a fadiga e a necessidade premente
de reclamar da NET.
Tá,
essa última parece não fazer muito sucesso entre os mais novos também. Mas o
irônico é que foi ao lembrar dela que comecei a me dar conta, faz alguns anos,
de que apenas achamos que precisamos de algo, quando de fato não precisamos.
Existem
hábitos e supérfluos que estão tão impregnados em nosso dia a dia, que passamos
a considerá-los como indispensáveis. Em nossa juventude, corrida e invencível,
queremos mais. Precisamos de mais. Somos mais. Ou acreditamos que somos.
A
idade chega e percebemos que a história não é bem assim. Pelo menos deveríamos
perceber. Não somos tão bonitos, tão legais ou tão especiais. Mas aceitamos isso
com muito mais facilidade. Essa clarividência é uma das virtudes do tempo.
Faz
uns cinco anos que cancelei aquela praga de serviço de tv a cabo e não morri até agora. Senti falta daquela
bosta durante uma semana apenas. Que bobo que eu era. Passei a ler mais, a ver
programas com mais critério e nunca mais tive que digitar meu cpf naqueles
telefonemas infernais. É claro que não seria preciso mencionar a porra da
conta, que deixei de pagar com especial prazer. Quase sexual.
O
incrível é que antes disso, se alguém me perguntasse, diria que a NET, com seus
“trocentos” canais, dos quais vemos uns 3 ou 4, seria tão relevante quanto o
fornecimento de gás, em minha cabecinha anestesiada pelos comentários
inteligentes e inéditos, propalados no SporTV.
Daí
para frente, comecei a contar quantas coisas eu não precisava. E não precisava
de uma porrada delas. Que antes jurava que precisava, lógico. A idade muda os
paradigmas. Alguma compensação há de haver. E há.
Não
precisava de tantas roupas, de tantos relógios, trocar tanto de carro, não
precisava comprar tanto, não precisava tanto ser o que não queria ser. Não
precisava de “mais”. Com a idade, não é só a pele que cai. A ficha também.
Não
me entendam mal, nós continuamos a desejar às coisas. Apenas sabemos que não
“precisamos” delas. A realização pessoal nunca esteve ligada a elas. Nos dizem
isso, mas é mentira. A televisão nos diz, os shoppings nos dizem, os que tem,
nos dizem. Tudo baboseira. Tudo tapação de buraco.
Não
precisamos de um Iphone com uma câmera melhor, acreditem. Precisamos de afeto.
De um beijo na boca. Mas um que signifique algo. É disso que precisamos.
Foda-se a NET.
Foda-se
se você vai comer no McDonald`s ou no Burger King. Muda o quê, mesmo? Foda-se
se seu jeans é Diesel ou é à gasolina. Foda-se se o Neymar tá comendo a
Marquezine. Foda-se se o tempo vai virar, leva o guarda-chuvas. Foda-se se você
deu um arranhãozinho no retrovisor. Foda-se bem, foda-se mal, vocês conhecem a
rima...
O
que quero dizer meus caros, é que a dor no joelhos e a barriguinha não são a
única coisa a se contabilizar. Existe mérito no tempo. A vida será sempre
difícil, aparentemente injusta ou até sórdida em alguns casos. Mas você percebe
que não será o acúmulo que resolverá isso. Muito menos a NET.
O
tempo te faz, inclusive, aceitar a complicada verdade de que o “que não tem
solução, solucionado está”. O que não implica em desistir. Mas em “lidar”.
É
mais do que óbvio que cada um traça metas distintas em sua existência e que,
verdades absolutas só existem na religião e nas cabeças fundamentalistas. Mas
uma coisa se descobre com o tempo: que coisas significativas ainda farão diferença mesmo anos à frente. E "aquela camisa tão bonita"? Será que significará algo daqui a dois
meses? Não se farão outras camisas? Vale eu me apertar, me preocupar para adquiri-la? Estou com poucas?
Mesmo? Se eu não a tiver, morrem crianças na Somália?
Preciso
comer tanto, todos os dias? Beber tanto, todos os dias? Ser tanto, todos os dias?
Acho muita responsabilidade ser tanto. Dá angústia, pressão alta, derrame, calo
no pé.
No
balaio com a NET, se foi muita coisa. Serviu para algo. É claro que ela só foi
uma desculpa para o que já sabia. Mas que se dane, vai levar a culpa. Merece. O
fato é que, tiradas nossas necessidades primárias, como alimentação, moradia e
vestimenta, o resto é discutível. E muito desse resto é ilusão, fantasia,
imaginário. Muito mesmo. Mas queremos mesmo assim. Fazemos birra, batemos
pezinho. Tal qual a uma criança que teve um picolé recusado na padaria.
Saber
separar as coisas é o pulo do gato, porque “nem só de pão vive o homem” e um
brigadeiro ou um bom whisky pode fazer diferença em um dia difícil. Mas note
que você não irá se lembrar deles daqui a alguns “dias”. Mas talvez vá se
lembrar do abraço ou beijo dado, ou pior, não dado, em seus pais em alguns “anos”,
quando eles não mais estiverem por aí. Velhice, lembram?
Então
é disso que devemos correr atrás. Do que faz diferença. E também, do que nos ajuda a perceber o que faz
diferença. Cultura em todas as suas matizes. Conhecimento.
E é
justamente o afeto conjugado com o saber, que te dá a paz e a tranquilidade
para distinguir o que é relevante ou
não. O que importa "mesmo" nessa vida bandida. É essa sapiência que faz a
foto da sua vida ficar bonita de verdade, não o “S” no Iphone.
É
verdade, não tenho mais NET. Mas tenho mais paciência com meus pais, mais tempo
para dar à minha esposa, escolho fora do controle remoto. Tem gente que aprende
isso com vinte. São uns abençoados. Mas tem coisas que só a vida e seus
corolários funestos, te enchendo de porrada, é que te ensinam.
Não
deixe de se presentear ou fazer o que se sentir compelido a fazer se for o
caso, mas por favor, nesse processo, não diga que PRECISA. Diga que você QUER! Muito
provavelmente você nem se recordará daquele mimo em poucos dias. Quantas
gavetas já lotamos de imprescindíveis esquecidos?
Talvez
essa seja a maior benesse e o maior condão de se envelhecer. Saber que o tempo
fica cada vez mais exíguo e não se deve despendê-lo com o que é inútil ou
irrelevante. E melhor...se aprende a separar o que é inútil e irrelevante, do
que não é. Isso não é fácil e ninguém disse que seria. Mas a experiência compensa
um pouco as vicissitudes, rugas e estragos causados pelo tempo em nossas vidas.
Destarte,
abrace mais, beije mais, leia mais, converse mais, se entregue mais. Você não
vai encontrar isso em nenhum canal, de nenhuma tv a cabo. Nem no plano Maxiplus Pica das Galáxias
Chuck Norris, com desconto nos três primeiros meses. O plano a que me refiro, só a vida
oferece. E esse não tem jeito. Você “precisa” assinar.